ATA DA OITAVA SESSÃO SOLENE DA TERCEIRA SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA DÉCIMA LEGISLATURA, EM 16.04.1991.

 


Aos dezesseis dias do mês de abril do ano de mil novecentos e noventa e um reuniu-se, na Sala de Sessões do Palácio Aloísio Filho, a Câmara Municipal de Porto Alegre, em sua Oitava Sessão Solene da Terceira Sessão Legislativa Ordinária da Décima Legislatura, destinada à entrega do Título Honorífico de Cidadã de Porto Alegre a Senhora Maxia Faermann, concedido através do Projeto de Lei do Legislativo n° 53/90 (Processo n° 965/90). Às dezessete horas e dezesseis minutos, constatada a existência de “quorum”, o Senhor Presidente declarou abertos os trabalhos e convidou os Líderes de Bancada a conduzirem ao Plenário as autoridades e personalidades presentes. Compuseram a Mesa: Vereador Airto Ferronato, Vice-Presidente da Câmara Municipal de Porto Alegre, presidindo os trabalhos; Professor Olívio Dutra, Prefeito Municipal; Senhor Fernando Gonçalves do Nascimento, representando o Secretário de Estado de Recursos Humanos e Modernização Administrativa; Senhora Maxia Faermann, Homenageada; Senhores Maurício Faermann e Gladis Svirski, esposo e filha da Homenageada; Vereador Clóvis Ilgenfritz, 3º Secretário da Casa. A seguir, o Senhor Presidente pronunciou-se acerca da solenidade e concedeu a palavra ao Vereador Isaac Ainhorn que, em nome da Casa, falou do significado do Título hoje concedido por este Legislativo, dizendo representar ele o resgate da história de luta em prol da Cidade vivida pela Homenageada. Discorreu sobre o trabalho por ela realizado, atentando para a força sempre demonstrada por S. Sa., tanto em sua vida pessoal como profissional. Em prosseguimento, o Senhor Presidente registrou a presença, na Casa, da Senhora Antonieta Baroni e convidou os presentes a, de pé, assistirem à entrega, pelo Prefeito Olívio Dutra, do Diploma e da Medalha referentes ao Título Honorífico de Cidadã de Porto Alegre a Senhora Maxia Faermann, concedidos por proposição do Vereador Isaac Ainhorn, aprovada pela Casa. Em continuidade, concedeu a palavra à Homenageada, que agradeceu o Título recebido. Às dezessete horas e cinqüenta e três minutos, o Senhor Presidente agradeceu a presença de todos e, nada mais havendo a tratar, declarou encerrados os trabalhos da presente Sessão Solene, convocando os Senhores Vereadores para a Sessão Ordinária de amanhã, à hora regimental. Os trabalhos foram presididos pelo Vereador Airto Ferronato e secretariados pelo Vereador Clóvis Ilgenfritz. Do que eu, Clóvis Ilgenfritz, 3º Secretário, determinei fosse lavrada a presente Ata que, após lida e aprovada, será assinada pelos Senhores Presidente e 1° Secretário.

 

 


O SR. PRESIDENTE (Airto Ferronato): Por uma feliz iniciativa do Ver. Isaac Ainhorn, da Bancada do Partido Democrático Trabalhista – PDT –, a Câmara Municipal de Porto Alegre concede o título honorifico de Cidadã de Porto Alegre à Escritora Maxia Faermann. Seus livros têm importantes componentes históricos que resgatam a saga dos colonos judeus do Rio Grande do Sul. Como se isso não bastasse, nossa homenageada dedicou-se a meritórias campanhas e iniciativas voltadas à promoção da assistência social aos carentes e aos necessitados. Basta apenas uma lembrança para justificar esta homenagem. A Srª Maxia Faermann, em 1955, criou o Movimento Gaúcho pelo Menor, entidade que, certamente, já concorreu para diminuir essa problemática que representa uma vergonha para o nosso País, principalmente com as repercussões no exterior. Já na parte da promoção da cultura judaica, a Srª Maxia Faermann coordena o Movimento de Difusão e de Estudos Brasil-Israel há quatorze anos. Acredito que os Srs. Vereadores de Porto Alegre estão neste ato interpretando o desejo de seus cidadãos, em homenagear uma personalidade de tão relevantes serviços prestados. À Srª Maxia Faermann, a seus familiares, amigos e admiradores, queremos dizer que esta solenidade, esperamos, sirva de exemplo e reconhecimento àqueles que possuem o espírito de desprendimento para servir à comunidade.

Passamos a palavra ao proponente deste evento, Ver. Isaac Ainhorn, que falará em nome de todas as Bancadas com assento nesta Casa.

 

O SR. ISAAC AINHORN: Senhores e Senhoras, realmente, esta é uma homenagem que eu julgo singular de parte da representação política da Cidade de Porto Alegre. Representação política, representação social é a expressão do conjunto, é o conselho da Cidade e conselho da Cidade é a Câmara de Vereadores de Porto Alegre. Há uma Lei Municipal que concede a determinadas pessoas a maior honraria, a maior homenagem que uma pessoa pode ter no âmbito da            Cidade de Porto Alegre que é o título de Cidadão de Porto Alegre. É uma honraria que se coloca dentre aquelas homenagens como a maior de todas as homenagens que a Cidade empresta a uma pessoa. Tanto isso é verdade que ela tem um procedimento todo especial. Primeiramente há um projeto de lei, esse projeto é examinado por diversas comissões desta Casa, como uma lei, porque a concessão do título de Cidadão de Porto Alegre se constitui numa lei que chega ao Plenário e é votada e exige um “quorum” qualificado de dois terços dos Vereadores da Cidade, ou seja, na nossa Câmara, de trinta e três Vereadores, para aprovar-se um título desta natureza são precisos vinte e dois votos.

Para honra da Cidade, desta Casa, um reconhecimento para satisfação e honra dos amigos da Dona Marta, dos seus parentes, dela como resgate na sua história da Cidade, ela obteve a unanimidade dos votos dos Vereadores exatamente pelo reconhecimento de um trabalho que exerceu, no decorrer do tempo, aqui na Cidade de Porto Alegre. E depois de aprovado vai ao Sr. Prefeito, que a sanciona e a transforma, a partir daí, numa lei quando publicada no Diário Oficial. Por todo esse trâmite, por todo esse procedimento passou o título da hoje Cidadã de Porto Alegre Marta Faermann. E, a exemplo de muitos imigrantes, uma das coisas curiosas – e cito o exemplo da nossa querida homenageada –, é a questão do nome. O nome é uma coisa muito curiosa, as adaptações dos nomes oriundos da Polônia, da Rússia, das famílias de imigrantes que vêm para cá e têm um nome mais vinculado à tradição da sua história, das suas raízes, aqui se faz a adaptação. Por isso, a nossa Maxia Faermann é a nossa Marta Faermann. Essa é a história muito sui generis em relação à saga, Ver. Presidente, da colonização judaica, que teve uma presença muito marcante no Rio Grande do Sul. E essa é uma característica inerente ao nosso Estado, é uma característica do verdadeiro cadinho racial que se constitui o nosso Estado, que repele qualquer forma de discriminação, e não é apenas peça de um discurso retórico, é um cadinho racial da presença inicial de portugueses, de negros, de alemães, de italianos, de judeus, de árabes, de todas as comunidades, russos, poloneses, que aqui vieram fazer a América. E o fazer a América, para algumas comunidades, se deu em situações extremamente adversas, porque ninguém imigra de forma gratuita, são raros os casos. E a comunidade judaica da qual a Dona Marta é uma representante tão significativa, pela sua característica de mulher obstinada, decidida, de uma têmpera extremamente forte, com um misto de obstinação, de luta e também com aquela característica daquilo que se chama a mãe judia, ou a idisch mam, e que tem seus similares nas mães de outras raízes, como a italiana, la mama, e tantas outras. Então, a nossa homenageada, ao lado de todo aquele seu cuidado, da sua dedicação, do seu zelo à sua família, ela sempre teve tempo de se dedicar à atividade de natureza social, de estar ao lado de movimentos culturais.

Vejam os Senhores a história dessa saga da colonização que hoje a Dona Marta expressa, aqui, neste reconhecimento que a Cidade faz ao seu trabalho e a sua luta e ela representa um título que é concedido a ela e a toda uma comunidade. Quando seus pais, no início do século, vieram para cá, já se antevia, não só se antevia, mas já existiam manifestações claras de perseguições à comunidade judaica, já existia na Europa Oriental. Ali, onde por mais de quatrocentos anos a comunidade judaica teve condições de vida tranqüila na Polônia, na Alemanha, no século passado as coisas começaram a se modificar e esses imigrantes russos, polacos, judeus-russos, judeus-polacos que vieram para cá vieram exatamente em função de fatos concretos que eram os “progroms”. As perseguições de que os judeus eram vítimas nessas regiões da Europa Oriental, onde o semitismo era uma marca muito presente naquele período da Europa Oriental, isso os fez vir para cá, naquele período, para construir uma nova vida em condições extremamente adversas, vindo para uma região com características geográficas completamente diferentes daquelas a que eles estavam acostumados. Foram para atividade agrícola, foram para Quatro Irmãos, foram para Ereban e, ainda hoje, lá no Erechim, Quatro Irmãos se vê a presença da comunidade judaica em atividades agropastoris, porque as raízes do povo judeu foram agropastoris. Lá, há mais de dois mil anos e, posteriormente, depois da diáspora, ele teve que sobreviver em situações difíceis e optou por outras atividades, porque eram aquelas que lhe permitiam que ele pudesse executá-las.

Então, é exatamente dentro dessa realidade que os pais de Dona Marta, assim como centenas, milhares de pessoas vieram aqui para a colonização de Erebango, de Dois Irmãos, também próximo a Santa Maria. Esta Casa homenageou também um outro filho daquela região, o nosso querido Marcos Rachevski, que está aqui, esta figura tão querida da nossa comunidade que teve o reconhecimento desta Casa com o título de Cidadão de Porto Alegre que lhe foi outorgado. E hoje, Sr. Presidente, Srs. Vereadores, minhas senhoras e meus senhores, ela resgata uma história ao conceder à Dona Marta Faermann o título de Cidadã de Porto Alegre. Ela é uma Cidadã de Porto Alegre com todas as prerrogativas que são inerentes a um cidadão. Ela é uma porto-alegrense por opção. Eu acredito, sinceramente, que por sua atividade que foi arrolada, desde a fundação do Movimento Gaúcho pelo Menor, lá em 1955, como bem destacou o Ver. Airto Ferronato, quando, talvez, fosse muito mais fácil resolver a questão do menor há trinta e cinco anos, mas já era uma questão séria. E nesses trinta e cinco anos essa questão vem se agravando consideravelmente. Hoje é um problema dos mais sérios, o problema da criança. E, se não encararmos essas questões e procurarmos caminhos para equacionar essa questão do menor, da criança abandonada, a questão da educação, nós não sabemos o que será do nosso País dentro de dez anos, quando entrarmos no terceiro milênio. Eu vou dizer nove anos, senão o Ver. João Dib vai dizer que eu não sei fazer conta. Nove anos é o tempo que falta para entrarmos no terceiro milênio. Dona Marta, eu gostaria de fazer um registro muito especial que me solicitou o Ver. Lauro Hagemann, do Partido Comunista Brasileiro, que não se encontra presente porque tinha um problema imediato para ser resolvido, de sua saudação e da satisfação dele na outorga deste título que hoje a Câmara de Vereadores, formalmente, lhe faz entrega na presença da autoridade maior do Município, o Sr. Prefeito Municipal.

Eu acredito, sinceramente, que esta Casa, Dona Marta, se sente também orgulhosa de ter conferido este título, nesta oportunidade, à Senhora. Quisera que esta Casa sempre, historicamente, mantivesse o padrão dos títulos honoríficos como o que hoje lhe confere nesta homenagem, neste final de tarde. Tenho certeza de que este título servirá, também, de estímulo à Senhora e seu esposo para que continuem se dedicando à Cidade, às obras sociais e culturais. Tenho certeza de que dos dois livros que já editou “Vivências” e “A Promessa Cumprida”, também possa se transformar num terceiro livro, numa nova contribuição à nossa Cidade, ao nosso Estado e ao nosso País. Eu tenho certeza de que o seu trabalho realizado até então não é uma obra encerrada, sabemos e temos convicção de que outros trabalhos em benefício das pessoas da nossa terra e da sua comunidade serão feitos. Muito obrigado.

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Anunciamos a presença da Srª Antonieta Barone. Convidamos a todos que se ponham em pé para assistirmos à entrega do título e medalha à Srª Maxia Faermann pelo Sr. Prefeito Municipal.

 

(É procedida a entrega-se do título.)

 

O SR. PRESIDENTE: Concedemos a palavra à nossa homenageada, Srª Maxia Faermann.

 

A SRA. MAXIA FAERMANN: Sr. Presidente dos trabalhos, Ver. Airto Ferronato; Sr. Prefeito Municipal, Dr. Olívio Dutra; Sr. Fernando Gonçalves do Nascimento, representando a Secretaria de Recursos Humanos e Modernização Administrativa; Dr. Isaac Ainhorn, também representando as Bancadas do PDT, do PT, do PDS, do PMDB, do PTB, do PCB, do PFL e do PL; todas as pessoas que representam entidades ou que aqui vieram me homenagear com as suas presenças. Meus senhores e minhas senhoras.

A idéia do ilustre Ver. Isaac Ainhorn, aprovada por unanimidade pela Câmara Municipal, indicando o meu nome para receber o honroso título de Cidadã de Porto Alegre e as bondosas palavras proferidas pelos ilustres Vereadores a meu respeito calaram profundamente em meu âmago. A todos, meus sinceros agradecimentos. Vossas palavras, quentes e sinceras, tiveram o dom de fazer com que a emoção e a alegria inundassem o meu coração.

Eis-me, pois, aqui, perante esta Colenda Câmara Municipal, lídima representante do povo desta Cidade, para receber este honroso galardão. Efetivamente é um prêmio que modestamente recebo como fruto de uma longa jornada iniciada nos idos de 1955 e que até o presente momento ainda não teve o seu encerramento. Não faltarei à modéstia se confessar que se muito recebi, também procurei dar, neste longo caminho palmilhado dia-a-dia com o fito único e exclusivo de praticar o bem e levar alegria aos aflitos e aos desamparados e mal atendidos por quem de direito.

No curso desta caminhada e a cujo sucesso atribuo também à colaboração inestimável de pessoas que sentiram o mesmo problema que a mim afligia, como por exemplo: o amparo ao menor abandonado. Fiz de minha vida uma religião. Não descansei um só momento até que visse com os próprios olhos o resultado de minha luta e minha obstinação. Assim nasceu o Movimento Gaúcho pelo Menor, e repetido com sucesso surgiu o “Pedágio Faça uma Criança Sorrir”, e também um grande “Leilão de Arte” congregando artistas plásticos de todo o País, que teve cunho beneficente e cultural.

Não satisfeita com o trabalho realizado no campo da benemerência, lancei dois livros: “Vivências – Diários de Leituras” em 1987 e “A Promessa Cumprida” – Histórias Vividas e Ouvidas de Colonos Judeus em Quatro Irmãos, Baronesa Clara, Barão Hirsch e Erebango – em 1990.

Estes trabalhos como tantos outros, já de vosso conhecimento pelas palavras do ilustre Vereador que honra esta Câmara com seu dinamismo e denodo, sempre olhando as pessoas que trabalham pelo bem social, assim como os demais Vereadores desta Câmara.

Retroagindo ao passado longínquo dos anos de 1922, volvo à Colônia de Quatro Irmãos onde nasci, e de 1930 a 1942 à Erebango, onde vivi com meus pais, imigrantes judeus que aportaram ao Brasil em 1913. Terra que os recebeu de braços abertos e que para eles era sonhado como se fosse verdadeiro Éden.

Esta pessoa que agora vos fala, e glorificada com o título de Cidadã de Porto Alegre, foi aquela menina moça, ingênua e cheia de sonhos que na época lia romances como “A Moreninha”, “O Moço Loiro”, “Orgulho e Preconceito” e outros, que amadurecida, como num passe de mágica transportou-se à literatura inglesa de Shakespeare. Assim, no mourejar contínuo não descurou e fez com que a sua vontade de perseguir o ideal a que se propôs alcançasse o fim colimado, ou seja, o bem do próximo.

Hoje, vejo-me rodeada pelo marido, filhos, netos, irmãos e amigos. Mas penso em meu pai, que também está aqui tão presente, hoje, como no ano de 1913 em que por primeiro aportou nesta Cidade. Penso ao mesmo tempo em minha mãe, cujos dotes formaram minha pessoa e o meu modo de ser. Ela esta hoje aqui, presente, como se viva ainda fosse.

Com este reconhecimento, dado por esta insigne plêiade de Vereadores, fico cheia de orgulho, de emoção profunda e de gratidão ao Ver. Isaac Ainhorn por ter tomado a iniciativa de indicar meu nome; gratidão ao meu marido, companheiro de todos os anos vividos nesta Cidade; gratidão aos filhos, netos e amigos.

Finalizando, desejo agradecer do fundo do meu ser a recepção que me proporcionaram e a satisfação de terem me ouvido, deixando extravasar assim os meus sentimentos. E por analogia permitam que eu encerre o meu pronunciamento com um soneto de Wordsworth, poeta romântico inglês do século XIX, que escreveu o soneto “Sobre a Ponte de Westminster”.

Se eu pudesse parar nesta hora sobre a ponte do Rio Guaíba, eu diria como ele: “O mundo não tem nada mais belo do que esta cidade que agora usa como uma roupagem a beleza do anoitecer. Silenciosos, bem delineados vemos os navios, as mansões, os teatros e os templos. Obtusa seria a lama a quem isso passasse desapercebido.”

Não sabemos quanto potencial existe nesta nossa Cidade; que nada disso fique sem desabrochar e que nós, mais velhos, sirvamos de estímulo vivo. Amigos, gratidão não se escreve, se sente aqui no coração! Profunda e comovidamente obrigada por fazerem de Marta Faermann uma Cidadã de Porto Alegre. (Palmas.)

 

(Não revisto pela oradora.)

 

O SR. PRESIDENTE: Estão encerrados os trabalhos.

 

(Levanta-se a Sessão às 17h53min.)

 

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